Existe um grande debate entre as pessoas que tentam fazer uma trilha tão extensa quanto a Appalachian Trail. Para alguns a trilha não exige nenhum treinamento em especial: a própria trilha irá cuidar de deixar seu corpo em forma, pronto para os milhares de quilômetros que estão por vir. Um segundo grupo, no qual me incluo, acha que não: se você quer realmente chegar até o final é bom ir se preparando. Bastante.
Dentre as três grandes trilhas americanas a Appalachian Trail é a menor, mas é também, indiscutivelmente, a que tem a maior variação de altitude. São mais de 500 mil pés de sobe e desce. 16 Everests, eles pregam! E pra enfrentar um monstro desses não dá pra ir despreparado.
Faltando menos de 90 dias para meu início entro na reta final de treinos e exercícios. Reta final porque desde o início de 2016 já venho treinando, de alguma forma, para isso. Primeiro foram os livros, onde tentei entender a trilha. Depois a Estrada Real, que fiz em junho de 2016. Andar aqueles 1200 km foi uma prova: se conseguisse completá-la bem provavelmente conseguiria fazer a AT.
A partir de agora eu divido meu treinamento em três atividades: caminhadas com a mochila, corridas e exercícios físicos.
As caminhadas eu faço quatro vezes por semana. Segundas, quartas e sextas caminho na cidade. Encho minha mochila de livros – Senhor dos Anéis e Guerra dos Tronos são os escolhidos, por motivos óbvios: os 8 livros das duas coleções pesam mais de 8 quilos! – e saio caminhando pela capital mineira. E quem conhece Belo Horizonte sabe que a cidade não é para fracos. Tenho preferência pelos morros do Santo Antônio, Gutierrez e Sion. Ando umas três horas por dia com a mochila nas contas.
Aos sábados as caminhadas são nas várias trilhas nas proximidades da cidade. A do Topo do Mundo até Moeda, por exemplo, é um trilha que muita gente diz ser difícil. Na minha última caminhada resolvi medir a variação de altitude. Pra ir e volta são cerca de 23 quilômetros de distância e um pouco mais de mil metros de subidas e descidas. É daquelas que você chega no final pedindo penico, com tanto morro que atravessa. Gravei o vídeo abaixo explicando um pouco. Veja só:
Olha que coincidência: estou planejando andar a Appalachian Trail por 150 dias, uma média de 23 quilômetros por dia. Exatamente a distância da trilha do Topo do Mundo. E quer saber mais? Se a gente dividir a variação total da AT pelo número de dias que estou planejando caminhar (515 mil pés por 150 dias) vamos ter um ganho ou perda de elevação de 3400 pés por dia. Que são, acredite, 1036 metros. Sacou? Fazer a Appalachian Trail é, na verdade, fazer a trilha do Topo do Mundo até Moeda ida e volta por 5 meses, caminhando todos os dias. Quer saber? Choquei.
Pra encarar isso eu intercalo as caminhadas com mochila com corridas, que faço às terças e quintas. Estou aumentando tanto a distância quanto o ritmo gradualmente. No momento estou fazendo 5 km em 30 minutos e até abril a ideia é correr 15 km duas vezes por semana.
E finalmente, pra conectar isso tudo, tenho feito Gyrotonic, um método de condicionamento físico que foi criado ainda nos anos 70 por um ex-bailarino romeno. A ideia por trás do Gyrotonic são exercícios fluidos, circulares, de rotação e torção em aparelhos. A ideia aqui é reforçar a musculatura e evitar lesões, um dos motivos que mais tiram os caminhantes da trilha. Faço também três vezes por semana: vou pras aulas andando, levando minha mochila. As aulas de Gyrotonic são mais ou menos assim:
[youtube https://www.youtube.com/watch?v=Fbw3gdlMlWY&w=560&h=315]
Não mudei tanto a alimentação. Tenho diminuído o consumo de álcool nessa reta final, mas sem deixar de lado um taça de vinho de vez em quando. Também tenho comido menos carne vermelha e mais vegetais, mas porque sei que durante a caminhada minha alimentação vai se restringir, quase exclusivamente, à macarrão instantâneo, barras de cereais e outras porcarias. Vou tentar me alimentar bem sempre que possível, mas como vou ficar na dependência do que encontrar em cada parada, realmente não sei o que vou comer…
A preparação é pra chegar na trilha no melhor condicionamento físico possível. Sei da dificuldade da caminhada. E quero dar o melhor de mim para chegar ao final no prazo previsto.
Mas o treinamento físico é só uma parte. É preciso se preparar também psicologicamente e emocionalmente para a caminhada. E essa, eu acredito, é a parte mais difícil. Nenhum dos livros que eu li (nem o Appalachian Trials, um guia para se preparar psicologicamente e emocionalmente para a Appalachian Trail) vai conseguir me deixar pronto pra esse desafio. Eu só vou saber o que é ficar 5 meses longe de casa, no mato, na chuva, no tempo, falando uma língua diferente, comendo comida desidratada, passando sede e perrengues mil, quando realmente passar por isso. Vinte dias do Caminho da Fé? Moleza! 1200 km e um mês na Estrada Real? Fichinha.
Tenho total consciência da encrenca em que estou me metendo. Sei que vai ser mais difícil que estou pensando. Mas tenho meu objetivos claros: sei porque quero fazer a trilha, sei o que vai acontecer se eu conseguir. E sei também o que vai rolar se não chegar no final. Corpo são, mente sã. É assim que quero dar o primeiro passo.
Adilson Moralez
Jeff, parabéns pelo planejamento e por compartilhá-lo. Realmente é um grande desafio e na minha opinião está fazendo de tudo para superá-lo. Mas o mais importante é estar preparado para tudo, inclusive para um possível insucesso.
Sigo torcendo, grande
Jeff Santos
Adilson, que prazer receber sua mensagem! Obrigado pelas palavras! Abraço!