Vervey é uma pequena cidade suíça com 15 mil habitantes. É um local agradável, cercado de um lado por vinhedos reconhecidos como patrimônio cultural da humanidade pela Unesco (os vinhedos de Lavaux crescem em terrenos íngremes, quase escadarias, em uma técnica única, que rende alguns dos melhores vinhos brancos do mundo) e por outro pelas águas do Lago Genebra. Em suas ruas estreitas estão prédios antigos e atrações como o Museu do Alimento: é por causa dele que existe um garfo gigante cravado nas águas do lago. Foi ali também que surgiu a Nestlé e onde o diretor Charles Chaplin escolheu passar os últimos anos de sua vida. Dali a Montreaux, terra do famoso festival de jazz, são apenas 10 minutos de trem. Vervey é o tipo de lugar onde você chega e não quer mais sair. Exceto Sarah.
Sarah Marquis cresceu em Montsevelier, uma vila com pouco menos de 500 moradores no norte da Suíca e morou em Vervey por boa parte de sua vida. Conhecia suas ruas e seus habitantes, incluindo o dono do mercado de frutas e verduras orgânicos onde costumava fazer compras. Certo dia, no caminho pro mercado, se deparou com cartaz que mostrava imagens das planícies da Mongólia. “É pra lá que eu vou”, ela pensou. E foi.
Em 20 de junho de 2010 ela completaria 38 anos. Neste mesmo dia ela chegou na cidade de Irkutsk, na Sibéria. O clima nesta época do ano é agradável naquela parte da Rússia: por volta dos 10 graus. Da Rússia ela seguiu a pé, rumo ao sul. Ela carregava sua mochila com 35 quilos de equipamentos e mantimentos.
Poucos dias depois de começar sua jornada o termômetro marcava 20 graus. Negativos. Na Mongólia, o país que motivou sua viagem, durante várias noites sua tenta foi cercada por bêbados montados em cavalos. Sabe Marco Polo, a série de TV? Era mais ou menos aquilo. Cavaleiros mongóis chapados de Chinggis, a vodka local, cercando o acampamento de uma mulher solitária. Imagina a cena… Ela cruzou o país e continuou caminhando até chegar ao deserto de Gobi, na divisa com a China. E não parou: atravessou os países do sudeste asiático e em maio de 2013 chegou à Nullarbor Plain, sul da Austrália Ocidental.
Este não foi o primeiro passeio de Sarah. Nos anos anteriores ela já havia percorrido a Patagônia argentina e os quase 4.200 km da Pacific Crest Trail nos Estados Unidos. Ela também tinha dado uma volta na Austrália. Literalmente: foram 14.000 quilômetros de caminhada. Desta vez, entretanto, ela havia se superado. Depois de dois anos de preparação e mais de 1.000 dias de caminhada, Sarah havia percorrido 25 mil quilômetros. A pé. Além da realização pessoal, Sarah Marquis foi eleita em 2014 ‘Aventureira do Ano’ pela revista National Geographic*.
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* Marquis, Sarah: Wild by Nature: From Siberia to Australia, Three Years Alone in the Wilderness on Foot, Thomas Dunne Books, London, 2016
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