Dia 86, 09/07: West Mountain Shelter (1396.8) a Fort Montgomery (1403.8)
Distância do dia: 7 milhas | 11,26 km
Distância total: 1403.8 + 8.8 milhas | 2273,35 km
Distância que falta: 786.0 milhas | 1264,94 km
“Pra mim chega. Eu vim aqui pra caminhar, não pra escalar. Cansei dessa trilha”. New York estava tirando mais um do jogo. Ela era a sexta pessoa que passava pela mesa de piquenique que eu estava sentado, a terceira a reclamar de NY e a primeira a chutar o balde: se levantou, pegou na mochila as coisas que não iria precisar mais e jogou na hiker box, botou a mochila nas coisas e foi saindo. “Você vai mesmo pra casa?”, perguntei. “Eu não tenho mais casa. Tinha pensado em arrumar alguma coisa aqui mas não tem nada nessa cidade. Nada. Vou voltar pra Vernon e ver se consigo algo por lá”. E foi.
Realmente não tem nada em Fort Montgomery. O guia listava dois restaurantes e uma loja de conveniência. Os dois restaurantes, onde eu pretendia almoçar, estavam fechados: um de férias o outro permanentemente. Me restou a loja. Eu ainda tinha um dinheiro: os vinte dólares que a dona me deu. Sabia que ali aquilo não iria render muito. Por sorte o lugar tinha empanadas. Empanadas! Meio murchas, mas grandes e com recheio que valia os 2 dólares. Comprei as quatro últimas. Peguei também duas cervejas, um sorvete, um muffin. Contava as moedas pra ver se dava um café. “Pode pegar. É por conta da casa”, me disse o caixa.
Fiquei ali na mesa de piquenique em frente a loja comendo e bebendo enquanto outros hikers passavam, reclamavam e saíam. Cheguei ali cedo, antes de meio dia, e só saí depois das seis.
Foram só sete milhas, praticamente só descida, passando por pontos turísticos como a Bear Mountain (de onde se vê o skyline de New York City, o que eu já tinha visto do shelter). Dá pra chegar lá de carro, e o lugar estava cheio de vans de excursões de chineses e japoneses, que dividiam espaço com os americanos passeando de Porsches e Camaros, Harleys e Kawasakis Ninja.
Na chegada ao parque, outro choque. O lugar é destino de final de semana pra uma galera que mora nos arredores de NYC. Gente de toda etnia curtia o sol, fazia churrasco, aproveitava o domingo. E pra chegar na cidade o caminho era por ali.
A Appalachian Trail tem uma vantagem sobre outras trilhas: se você fizer o percurso correto você tem 100% de chances de ver um urso. Isso porque a saída do parque é por um zoológico de animais resgatados. E o urso está lá, no lugar que também marca a menor elevação da trilha. Já vi tanto urso no habitat natural que passei batido, conversando com a Diane, uma local que ia querendo saber da trilha e me dando os canais de como sair da confusão de turistas.
Fort Montgomery, a cidade, tem esse nome por causa do forte que existiu ali e foi palco de uma batalha entre americanos e ingleses em 1777. Localizado nas margens do Rio Hudson, estratégico pro comércio na época, hoje restam apenas os destroços do forte, destruído pelos ingleses. Mas o cenário é lindo, com três pontes e duas linhas de trem cruzando o rio.
Era debaixo de uma dessas pontes – a menor, só pra pedestres – que eu estava planejando dormir depois que saí da loja. Eu tinha que estar as 8 no correio pra pegar minha caixa com comida e dinheiro e não tinha nenhum outro lugar por ali. Acampar em locais não demarcados, só pra lembrar, é proibido em New York. Tô lá tentando decidir se durmo debaixo da ponte ou não quando passa o Wash Bear. “Tem um lugar que pode acampar a duas milhas daqui”, ele diz. Eu acompanhei. Teria que andar mais no dia seguinte mas pelo menos não correria o risco da minha próxima noite ser na cadeia.
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