Dia 54, 07/06: Hog Camp Gap (813.0) a Harpers Creek (834.9)
Distância do dia: 21.9 milhas | 35,24 km
Distância total: 843.7 milhas | 1357,80 km
Todo dia depois de escrever e antes de dormir eu planejo como vai ser meu dia seguinte. Calculo quantas milhas vou andar, com base na altimetria, no tempo e no meu estado físico. Vejo onde tem rios, riachos ou nascentes pelo caminho para que possa me programar quanto de água levar. Vejo se tem algum ponto de interesse, como cachoeira ou sítios históricos e dou uma pesquisada sobre. E vejo quais as cidades próximas, se vale a pena ir até ela ou não, com base no quanto tenho de comida. Algumas coisas, entretanto, não tem como ser planejadas…
Como ontem eu tinha feito um dia longo, planejei andar hoje um pouco menos que o que venho andado. Iria fazer 15 milhas, 24 km, até o The Priest Shelter e estava de bom tamanho. O dia seria fácil, então poderia dormir um pouco mais. A altimetria era muito tranquila, sem nenhum subidão. Por causa disso coloquei os bastões na mochila. Não iria precisar deles naquele trecho.
Acordei seis e pouco, meu horário de costume, ouvi o pessoal que acampava perto se preparando pra sair, virei de lado e dormi um pouco mais. Acordei por volta de oito com um passarinho pousado na barraca cantando. Sinal que o dia ia ser bacana…
Fiz tudo mais devagar: preparei café, guardei as coisas com calma, saí caminhando tranquilamente. O dia foi um passeio na floresta: a mochila tá quase sem comida, o que ajuda muito. Levei pouco mais de meio litro de água, já que tinha vários pontos pelo caminho.
Apesar de toda a minha preguiça da manhã, cheguei no The Priest Shelter pouco depois das duas. Fiz uma hora ali, lendo o livro de registros. Por causa do nome do abrigo (O Padre) ao invés de escrever o nome ou deixar um recado, quase todo mundo começava o registro com “Confesso que…” E contava uma pisada na bola, reais (“Confesso que não dependuro minha comida quando tá chovendo…”) ou imaginárias, espero (“Confesso que um assassino em série…”)
O lugar é agradável, mas ainda era cedo e resolvi andar um tiquinho a mais. A partir dali era praticamente um descidão de 6 km até uma estrada, depois uma subida não muito pesada até o próximo abrigo. Descia a montanha quase correndo, me divertindo com a mochila leve e a falta dos bastões. E ia pensando que faz tempo que não vejo um trail magic.
Quando chego na estrada o Yogi, um hiker que fez a trilha em 2015, está escostado no carro conversando com outro Hiker. Dou um “oi” e ele responde: “ei, quer uma Coca é uma banana?” Mas é claro! E fiquei ali ouvindo ele contar sobre o Shenandoah Park, que cruzo semana que vem.
Fui subindo os 5 km finais até chegar onde iria passar a noite já feliz da vida até que olho pra frente na trilha e lá está um filhote de urso. Minha primeira reação foi “Mãe do céu! Um urso! Um filhote de urso! Que demais! Eu vi um urso!” Mas exatos 0,03 segundos depois de pensar isso meu pensamento mudou pra “Putaqueopariu, onde é que tá a mãe desse moleque?” Ficar entre um filhote e a mãe é provavelmente a única forma que você pode ser atacado por um urso preto na trilha.
O ursinho assim que sentiu minha presença saiu em disparada ladeira abaixo, correndo tanto que levou trupicão tão sensacional que a imagem que ficou mesmo na minha memória do urso que vi hoje é uma bola preta rolando ladeira abaixo. Coitado do bichinho…
O dia só não foi 100% perfeito porque o ursinho não foi o único a levar um trupicão. Sem os bastões, fui fazer uma curva na descida, meu pé escorregou nas britas e caí, metendo a canela numa pedra. Corte, sangue, hematoma (mais um…) e minha perna, que já tava tipo uma pista de motocross de tanta picada de mosquito, agora ganhou mais um calombo. Mas nem isso foi capaz de tirar meu bom humor. O dia foi ótimo. E eu vi um urso (filhote, rodando ladeira abaixo, mas eu vi…)
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