Distância do dia: 33,33 km. Distância total: 976,43 km
Quase. O dia do quase. Eu quase me perdi. Quase fui a Itamonte. Quase não parei em Passa Quatro. Os 1000 km estão quase chegando. A divisa de MG e SP também. E em consequência a Estrada está quase no final. Quase.
Depois da noite de ontem eu tinha que esperar o café da manhã. Comi bem, estava com fome. Coloquei três bananas na mochila e me despedi da Ana, a dona da pousada. Já tinha descido a escada quando ela me gritou. “Aqui, tava esquecendo. Leva um milhinho pra você comer no caminho”. Agradeci, sem mencionar que milho não era bem o alimento ideal pra se levar, que eu já tinha pegado as bananas. Meti o saquinho com as espigas no bolso e saí cruzando a ponte em frente à pousada. Naturalmente subi o morro que leva ao hotel SerraVerde, imaginando que o caminho era ali. Por sorte subia um senhor empurrando a bicicleta. Ofereci uma espiga, puxei conversa e depois de passar a entrada do hotel ele me alerta que o caminho não era aquele. “Por aqui até chega, mas se você tá falando que vai passar por São Sebastião e Capivari o caminho é outro. Tem que voltar e pegar o asfalto”. Só aí me dei conta que não tinha nenhum marco do CRER na encruzilhada (do IER eu já desisti de procurar dentro das cidades). Voltei e só aí notei o marco que tinha deixado passar bem no meio da praça.
Estava frio – em torno de 10 graus – e o rio que corta Pouso Alto deixava tudo em meio a névoas. Até São Sebastião do Rio Verde era asfalto, pouco trânsito e cheguei lá bem quando o sino chamava pra missa das oito. Logo depois peguei a estrada de terra pra Capivari. Tempo ainda encoberto, ótimo pra caminhada. Cheguei lá e tive que tomar uma decisão: à esquerda voltaria e pegaria a estrada rumo a Itamonte, pra depois descer e chegar a Itanhandu. A direita iria pelo asfalto direto a Itanhandu, uma economia de 30km e um dia a menos de caminhada. Peguei à direita.
Itamonte ficou de fora do meu roteiro, mas como já não estou fazendo nenhum dos roteiros da Estrada Real completo não me arrependo (mais tarde até fiquei feliz em não fazer o trecho, já te conto). Em Itanhandu carimbei meu passaporte e segui pra Pé da Serra e Passa Quatro.
Os 12 km desse trecho são praticamente uma reta que segue o que restou da linha de trem e vai paralela à estrada. O guia da Estrada Real diz que “a paisagem tem como chamativo as inúmeras granjas de grande porte”, como se isso fosse um atrativo. Não se engane: é um alerta. O trecho chega a ser deprimente, com dezenas de galpões, cada um com centenas (milhares?) de galinhas confinadas, botando ovo após ovo. O cheiro é de titica. A cena te faz querer virar vegetariano.
Cheguei a Passa Quatro uma da tarde e tinha outra decisão pela frente: ficar ou seguir? O problema, que eu já tinha identificado quando programei a caminhada, é que a partir daqui as opções de hospedagem são mais raras. Depois de Passa Quatro poderia ficar em uma pousada a 20km dali. Cheguei o preço: 250 reais. Nope. Fui carimbar o passaporte na São Rafael: 135. Nope. Tentei a Eco, ninguém atendeu. Olhei o hotel da cidade, que todo mundo diz que é péssimo. 100. Procurei outras pousadas, ali ou mais pra frente, no bairro de Pinheirinhos. Tudo caro. E aí já era quase três da tarde, e eu sem decidir o que fazer e pra onde ir. Já não daria pra ir pra nenhum lugar. Acabei voltando pra Sai Rafael.
Estou eu indo pro hotel escuto alguém chamando: “Jefferson!”. Espera: eu? Aqui? Olho pra trás e tá lá o Adilson, que conheci na casa do Roberto. Ele chegou faz tempo, mas foi subir a serra e tinha acabado de voltar. Ótimo revê-lo, despedimos e tinha certeza que não o veria mais.
Quarto ótimo. Banho bom. Tudo ok. Hora de comer. Quatro da tarde. O que tem aberto? Nada, claro. A não ser um café perto da Pousada, onde poderia pelo menos comer um salgado. Entro pra pedir e quem eu encontro? Adilson. Tinha só passado pra comprar uma água, mas paramos pra falar um pouco dos últimos dias de cada um. E ele me conta que a ida pra Itamonte foi pesada, e que ficava pensando em mim fazendo o trajeto. Que a cidade não tem nada de mais, que o visual é bonito mas nada que a gente já não tenha visto e que fui feliz na escolha de deixar Itamonte de lado.
A empada, os cafés e o croq monsieur ajudaram na fome, mas precisava de mais. E a cervejaria Napoleão já estava aberta às cinco. Fui pra lá querendo algo com mais sustança. Sanduíche e cerveja, ótimo. Mas o problema é que o lugar também reúne os fãs de futebol, que discutiam os resultados do domingo. E como trilha sonora as discussões as caixas de som do lugar tocavam Engenheiros do Hawai, que se misturam ao som dos cantos religiosos que saiam dos altos falantes da igreja em frente. O caos.
Mas comi, não vou dormir com fome, mas vou dormir mais pobre. Passa Quatro é cidade de fim de semana de paulistanos, e segue os preços de lá. Ao final do dia gastei quatro vezes mais do que vinha gastando em Minas. E ainda nem cruzei a divisa.
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