Appalachian Trail S01E41

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Dia 41, 25/05: O’Lystery Pavillion (556.5) a VA 623, Saint Luke Hostel (574.3)


Distância do dia: 17.8 milhas | 28,65 km

Distância total: 582.8 milhas | 937,92 km


Quando eu era criança, devia ter uns 2 ou 3 anos, minhas irmãs  mais velhas me vestiram de menina e me levaram na vizinha dizendo que eu era uma prima que morava noutra cidade e que estava ali de passeio. Não sei se a vizinha descobriu  o que era eu, mas na minha família sempre usam esse fato pra me sacanear…


A noite no acampamento foi dureza. Pode parecer loucura, mas o barulho do rio que passava ao lado do camping manteve acordado a noite toda. Aquele som continuo, de água correndo, não me deixava dormir. Ou achava que era chuva ou pensava que a barraca ia ser inundada. Ficar no meio do mato tem dessas coisas: tranquilidade é tranquilidade de verdade…

Acordei de madrugada ainda, mas enrolei até o dia clarear. Esperar o sol sair era em vão: ele iria ficar encoberto o dia todo. Ainda antes das 8 comecei a subir a montanha. A primeira do dia. 


“Virgínia é plana”, a mentira do século… foram pelo menos três subidas brabas no dia. Na última delas o destino era o Chesnut Knob Shelter, um abrigo fora dos padrões da AT. Todo de pedra, ele tem porta, ao invés das paredes abertas dos outros. Fica no topo de uma montanha aberta, sem árvores, o que explique. Cheguei lá pouco depois do meio dia, tremendo de frio – a temperatura tinha caído pra 5 graus e a neblina impedia de se ver um metro à frente. No shelter estavam o Tripod é o Dancing Bear.  Eu só queria entrar, botar uma blusa de frio – vinha caminhando com short e camiseta, as únicas coisas que estavam secas depois de dias de chuva – fazer um café e seguir andando.


Quando comentei meus planos, Dancing Bear se interessou. Parênteses para o Dancing Bear: ele é alemão, e começou a trilha com uma mochila que pesava 30 quilos. Desapega daqui, se vira dali, chegou a 18. Ainda pesado pra uma trilha como a A T ( a minha está em 12 e não tem dia dia que não penso em como aliviar isso…). Quando comentei que meus planos era ficar em um hostel a 6 milhas dali ele resolveu me acompanhar…


Falei pra ele que quando chegasse à estrada que leva ao hostel eu iria esperar por ele mas não adiantou. Dancing Bear tentou seguir os passos de Speedy Gonzalez e se deu mau. Eu descia a trilha quase correndo, e ele veio atrás. Quando vejo o cara leva um trupicão e se estatela na trilha, perna prum lado, braço pro outro, bastão de caminhada pra todo lado. Um hematoma aqui, um sangramento ali, mas tudo bem. Nada quebrado, nada muito sério. Reafirmei: “olha, meu Trail name é Speedy Gonzalez… eu ando rápido. Fica de boa que te espero na estrada…” e assim foi…


Quase. Queria que ele achasse que eu era realmente rápido, mas não tem muito isso. Por mais que alguém ande rápido na trilha ele está 5, 10 minutos na frente do próximo Hiker. E como antes de chegar na estrada parei pra tirar a blusa, logo o Dancing Bear me acompanhou. Fizemos as últimas milhas juntos, conversando sobre a Ângela Merkel, o Trump e outras bobagens.

O hostel era uma casa principal e um celeiro. O que eu precisava era de um banho quente e roupas limpas, tudo na casa principal. A gente iria dormir no celeiro. E quando​ o Bill, o dono do lugar, nos deixou no celeiro perguntei se tinha alguma roupa que poderia usar enquanto lavava as minhas. Não tinha. E eu com todas as minhas peças molhadas e sujas de lama…


Hiker box são caixas que existem nos lugares onde a gente passa onde os caminhantes deixam tudo o que não querem mais. Comida, equipamentos, e roupas. Olho na Hiker box do hostel e entre as poucas coisas dentro tinha um vestido. Não tive dúvidas. Tirei a camiseta e o calção ensopados, botei o vestido e fui pra casa principal tomar um banho e lavar as roupas, crente que as únicas pessoas ali eram eu, o Bill e o Dancing Bear (que nessa hora já falava que quando me encontrou nunca imaginaria que no final do dia eu estaria num vestido…)


Abro a porta e lá estão mais cinco pessoas. “Já ouviram a expressão ‘the trail provides?’ Pois é…” Foi só o que eu disse, e subi pro banho. Na volta ficamos ali de bate-papo e Bill cozinhou o melhor jantar até o momento. Só tirei o vestido quando minha roupa já estava limpa e seca. 

2 Responses

  1. Flavio Soares

    Jeff, adorei seu Trail Name! Esteriotipos a parte, nada melhor que um personagem Mexicano na terra de Trump. E o celular, você comprou outro ?

    By the way… seu vestido me lembrou o grande Laerte! Abraços

    • Jeff Santos

      Comprei um Motorola pré-pago de 50 dólares. Tá ótimo. Mas quero um patrocínio da LG. O novo deles é incrível! Quanto ao nome, quando me perguntam se é porque ando rápido, eu digo que nao: é porque sou latino! 😂 Abraço pra todos aí!

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